quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Causos que eu não entendo #1 - Usina de Belo Monte

Entre tantas coisas que estão acontecendo, ou que já aconteceram, existem inúmeros causos que eu realmente não entendo. E imagino que eu não seja o único.

E é nesse sentido que resolvi compartilhar com vocês algumas das minhas reflexões, a partir da campanha #CausosQueEuNãoEntendo.

A campanha será divulgada por fotos no Facebook e com a hashtag para o Twitter. Assim, espero que você sinta o incômodo a cada nova reflexão e que também compartilhe as suas indignações conosco e com sua rede de amigos.

Participe, deixe sua questão e espalhe pulgas atrás das orelhas por aí.




segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Eleições no Pará


Já se sabe do resultado eleitoral no Pará, para a criação dos novos estados: Tapajós e Carajás. A população, em quase dois terços, disse “não”. E isso já era esperado, pois muitos perceberam a inutilidade de outros centros administrativos na resolução de problemas sociais.

No entanto, alguns aspectos desse episódio devem ser debatidos. Em primeiro lugar, a boa inovação de consulta feita num plebiscito. Essa forma de participação direta é sempre bem-vinda. É preciso deixar claro: o voto representativo - pelas urnas nas escolhas dos políticos - é insuficiente para expressar a vontade popular. Daí a necessidade de todos apontarem, sem a intermediação de candidatos, suas vontades sociais. E ainda mais: isso também é pouco, enquanto não se resolver o “nó da questão”, o peso do poder econômico influenciando as decisões. É oportuno indagar: vivemos numa democracia ou plutocracia (governo dos mais ricos)? Responda você mesmo.

Mas qual o motivo da consulta “fora de hora”?

A causa dessa consulta regional está nas insatisfações quanto ao desenvolvimento desigual no Pará. A região de Carajás, por exemplo, é onde se concentra a exploração de ferro e agronegócio. Isso resultou na aceleração da desigualdade social com mais de 2/3 de sua população vivendo fora do mercado oficial de trabalho. Isso traz consequências: a cidade de Marabá, que seria sua nova capital, é a quarta em número de homicídios no Brasil e outras duas localidades, Itupiranga e Goianésia, estão entre as dez cidades mais violentas do país. No campo, prosseguem os conflitos agrários - lembram-se do Massacre de Eldorado de Carajás - entre latifundiários e posseiros?

Tapajós, a outra região pretendente, está isolada. Só detém 127 quilômetros asfaltados dos 5.300 quilômetros do estado que levam para outras capitais. Sua economia é feita na exploração da floresta pelo desmatamento. É lá que pretendem construir a hidrelétrica de Belo Monte. Índios, posseiros, desempregados da cidade, estão com poucas possibilidades de sobrevivência.

A região de Belém, embora possua o principal porto, está com problemas de arrecadação. Deixa de faturar anualmente 1,5 bilhões de dólares na exportação de minério por determinação de leis federais e só fica com 237 milhões. Somando a sangria do dinheiro público pela elite local, não se resolvem problemas sociais.

Conclusão: são três salas numa só casa/ onde falta pão, cama e fogão/ poucos mandam/criam a confusão/ e pela lateral/camuflam o essencial.


terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Sócrates era tricolor

 
Foto: Agência Estado
Gatos têm estilo. A bossa nova condensa estilo. Niemeyer, nas suas curvas arquitetônicas, criou um estilo. As curvas de inúmeras mulheres, em suas cinturas, possuem estilo. Orquídeas nascem estilosas. Os franciscanos estão à procura do estilo. Colares de pérolas enfeitam estilos. O cool jazz cria atmosfera para o estilo. Fontes, no marulho das águas, permeiam o estilo. Coincidências são sincronicidades de estilo. E o futebolista Sócrates, no toque de bola, encantava com seu estilo.

Certa vez, antes de ir para a Fiorentina, dando entrevistas para jornalistas italianos e bebendo bastante, um periodista lhe perguntou: “Você é um atleta?”. Ele respondeu: “Não, sou um artista da bola”. Pimba! Marcou mais um gol. De destreza e inteligência por sua improvisação, de precisão e simplicidade.

Tenho a impressão (uma certeza, na verdade!) que o “Doutor” decodificava o mundo - política, arte, religião, economia, emoção - dentro das quatro linhas do gramado. E sabia disso. Por quê? Ele sentia o quê os adversários desejavam. Pensava, com régua e compasso, a estratégia a ser usada. Incitava a torcida com seus punhos fechados. Desafiava as regras quando necessário. E criando improvisações, abria espaço para suas vitórias. Nossas vitórias!
                               
Ele era o que todos nós gostaríamos de ser. Um criador intelectual. Um bon vivant sério. Um cachaceiro que não fica bêbado. Um esportista político. Um mestre ensinando pelo seu corpo. Um improvisador - seu toque de calcanhar - que conserta o errado. Um Dom Quixote do futebol.

No fundo, com tantos dons, Sócrates era um tricolor. Do Botafogo de Ribeirão Preto. E, ainda mais, este texto, de um são-paulino, confessa a admiração por um “cracaço” do futebol. E da Cidadania!   

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

K.: "Desaparecidos, mas não olvidados"

Imagem: Divulgação

O título faz referência ao texto de Maria Victoria Benevides. É a apresentação de "K." (capa ao lado), recém-lançado pelo jornalista e escritor Bernardo Kucinski.

O romance narra a dor que famílias de desaparecidos políticos sentem pelo "sumiço" de seus entes durante a ditadura militar.

Assim como recomendo a leitura do livro, compartilho esse texto, que é pontual e faz muito bem o papel de apresentar a obra aos leitores.

O trecho que merece destaque é:

"De todos os livros que já li sobre esse período de horror, este é o que mais me emocionou. Lembro-me de ter visto o rosto devastado de K. na Cúria Metropolitana, quando ficou até amigo de dom Paulo Evaristo. Minha emoção ao ler K. é primeiro de compaixão (solidariedade com a dor), depois de enorme raiva e indignação... pela indiferença de tantos; pela hipocrisia de alguns rabinos que negaram apoio à “impura” (!); pelo “perdão” aos torturadores e demais responsáveis, garantido pelo STF; pela canalhice dos que, até hoje, martirizam a família com “informações”; pelo papel repugnante da USP, que demitiu a professora por “abandono do emprego”; pelos políticos que têm ojeriza do tema porque não dá voto – pode até tirar; pelos “ex-combatentes” que falam não querer revanchismo... a lista é longa."

A autora continua, dizendo que "este livro vai marcar um espaço importantíssimo em nossa bibliografia sobre o que muitos ignoram ou escondem".

Por fim, ela deixa o recado:

"E a luta continua. Há que se desvelar a verdade para que não se repita, há que se exigir justiça para que a dignidade das vítimas seja respeitada e a criminalidade das 'autoridades' esclarecida e punida".

Faço dessas as minhas palavras.

Maria Victoria de Mesquita Benevides é socióloga e professora da USP. O texto está disponível no portal Carta Maior.